Dr. Eduardo José da Fonseca Costa

PRINCÍPIO NÃO É NORMA (22ª PARTE)

Dois temas ocupam um lugar central na teorização jurídica pós-moderna: 1) a ideia de que os princípios são normas e, por conseguinte, habitam o ordenamento jurídico ao lado das regras; 2) a ideia de que a construção da norma jurídica se inicia com o texto normativo editado pelo legislador, mas só termina o seu conteúdo e o seu sentido com o intérprete-aplicador. A persistência dessas ideais é tão forte que elas já se alojaram no subconsciente coletivo da comunidade jurídica, a qual responde aos grandes problemas do direito acionando-as por automatismo. Já não mais se reflete criticamente sobre as relações princípio-norma e texto-norma. Tudo se passa como se essa reflexão crítica fosse o revolvimento inoportuno de um problema já superado pela «pós-modernidade».

À Professora Cláudia Schwerz

 

 

Dois temas ocupam um lugar central na teorização jurídica pós-moderna: 1) a ideia de que os princípios são normas e, por conseguinte, habitam o ordenamento jurídico ao lado das regras; 2) a ideia de que a construção da norma jurídica se inicia com o texto normativo editado pelo legislador, mas só termina o seu conteúdo e o seu sentido com o intérprete-aplicador. A persistência dessas ideais é tão forte que elas já se alojaram no subconsciente coletivo da comunidade jurídica, a qual responde aos grandes problemas do direito acionando-as por automatismo. Já não mais se reflete criticamente sobre as relações princípio-norma e texto-norma. Tudo se passa como se essa reflexão crítica fosse o revolvimento inoportuno de um problema já superado pela «pós-modernidade». Trata-se de uma típica blindagem neoiluminista progressista, que qualifica a normatividade dos princípios e a separação entre texto e norma como ideias «modernas», «arejadas», «atuais», «contemporâneas», «vencedoras», «adiantadas», otimistas», «desenvolvidas», esclarecidas», «progressistas», e desqualifica qualquer reflexão crítica como «atrasada», «velha», «superada», derrotada», «retardatária», «retrógrada», «pessimista», «subdesenvolvida», «ignorante», «reacionária» (para um aprofundamento do tema, v. nosso O «fim da história» na ciência processual. <https://cutt.ly/B9tmuCP>).

Vale a pena deixar claro, porém, que uma coisa é defender a natureza normativa dos princípios, outra é defender a separação entre texto e norma. Não se trata de propostas necessariamente coteóricas. A rigor, uma afirmação não decorre da outra. Tampouco derivam de uma mesma base de premissas. Cada uma delas tem a sua própria circunscrição epistemológica. Em tese, é possível entrever normatividade nos princípios sem que se admita a divisio texto-norma. Em tese, é possível também admitir a divisio texto-norma sem que se entreveja normatividade nos princípios. Todavia, em não raras vezes, as duas ideias são apresentadas em conjunto, como se tivessem entre si uma «parceria espiritual», um «parentesco por afinidade», uma «relação significativa». Em geral, quem sustenta uma teoria sustenta a outra. Mas por que os apólogos da não transcendência dos princípios jurídicos dão tamanha importância a essa diferenciação drástica entre textualidade e normatividade? Por que os apólogos dessa diferenciação drástica entre textualidade e normatividade dão tamanha importância à não transcendência dos princípios jurídicos? Por que a teoria normativista dos princípios de direito precisa tanto do distanciamento quilométrico entre o «texto normativo» e a «norma jurídica»? Por que o distanciamento quilométrico entre o «texto normativo» e a «norma jurídica» precisa tanto da teoria normativista dos princípios? Por que se verificaentre as duas teorias uma attractio magnetica? Por qual razão se procuram, se reconhecem, se associam, se fortalecem e se radicalizam reciprocamente? Por que elas confluem matrimonialmente para idêntico propósito? Que tipo de força as compele a um enlace nupcial alquímico? Existe alguma estratégia oculta de natureza extrajurídica (política, moral, econômica, religiosa, científica, estética etc.), que motiva essa «simbiose inter-teórica», essa «união íntima», essa «correspondência»?

A distinção entre «texto» e «norma» é irretorquível se se assevera que, no processo interpretativo, o «texto normativo» é o ponto de partida e a «norma jurídica» é o ponto de chegada. De fato, mesmo em um Estado democrático-parlamentar de direito legislado, muitas vezes o juiz parte de uma disposição [= disposição «bruta» = «texto normativo»], mas ao cabo da interpretação aplica ao caso prático algo um tanto diferente do que estava inicialmente descrito [= disposição «líquida» = «norma jurídica»] (obs.: a rigor, uma disposição pode descrever um princípio, uma regra, ou somente parte de uma regra, cujo complemento se encontra em outra disposição; contudo, no presente artigo, quando se emprega o termo disposição, dá-se-lhe um sentido estrito, referindo-se à disposição que descreve uma regra em sua totalidade e que, por isso, lhe minudencia tanto a hipótese de incidência quanto a consequência jurídica). Logo, três são os possíveis resultados da interpretação: A) se a disposição «bruta» tem mais elementos que a disposição «líquida» (ou seja, se «texto» > «norma»), isso denota que o juiz procedeu a uma interpretação restritiva [lex plus dixit quam voluit]; B) se a disposição «bruta» tem menos elementos que a disposição «líquida» (ou seja, se «texto» < «norma»), isso denota que o juiz procedeu a umainterpretação ampliativa [lex minus dixit quam voluit]; C) se as disposições «bruta» e «líquida» têm exatamente os mesmos elementos e, portanto, são iguais entre si (ou seja, se «texto» = «norma»), isso denota que o juiz procedeu a uma interpretação declarativa. É interessante frisar que, na chamada «interpretação conforme a Constituição», o juiz procede a uma interpretação declarativa: descartam-se todas as demais interpretações desconformes; dessa maneira, a disposição «líquida» não resulta do aumento nem da diminuição dos elementos constituintes da disposição «bruta».

Sublinhe-se, outrossim, que, nas autênticas interpretações restritiva, ampliativa e declarativa, o juiz não delibera restringir, ampliar nem declarar. Ele não inicia uma interpretação já imbuído da intenção de restringir, ampliar ou declarar. Em suma, não se trata de resultados interpretativos planejados. Eles meramente«acontecem». Se de antemão o juiz planeja restringir, ampliar ou declarar, não promove uma interpretação, mas um malsinado «decido e depois fundamento». É voluntarismo puro e simples. Ora, na interpretação genuína, o juiz se abandona em um imperturbável movimento de vaivém contínuo entre os fundamentos-de-direito e os fundamentos-de-fato, promovendo a cada giro sucessivas reestruturações, correções e integrações no esboço interpretativo, até que esse refazimento serial seja interrompido pela necessidade de se proferir uma decisão definitiva (para um aprofundamento do tema, v., p. ex., nosso A motivação escrita e a escrita da motivação. <https://cutt.ly/e9fA1CW>). Destarte, os «métodos de interpretação» (literal, gramatical, lógico, sistemático, histórico, teleológico etc.) não são propriamente «métodos». Não se trata de procedimentos mentais rígidos definidos ex ante. Trata-se, na realidade, de tipos de trajetória espontânea que uma interpretação pode percorrer no curso da sua circularidade (obs.: na prática, amiúde, esses tipos se conjugam e, dessa forma, se reforçam de parte a parte).

Como se vê, a distinção entre «texto normativo» e «norma jurídica» - que pretende realçar a possibilidade de discrepância entre o ponto de partida e o ponto de chegada no processo interpretativo - é absolutamente natural. Exprime uma situação corriqueira mesmo sob o império da lei. Entretanto, essa distinção ganha ares de sobrenaturalidade quando se tenta substituir o Estado democrático-parlamentar de direito legislado por um «Estado aristocrático-judiciário de direito jurisprudencial» dizendo-se que: 1) princípio de direito é norma jurídica aplicável pelo juiz diretamente aos casos práticos; 2) o juiz pode, ao seu exclusivo tirocínio: 2.1) suprimir regra legal expressa que atente contra um determinado princípio de direito; 2.2) alterar regra legal expressa que concretize esse princípio de modo inexistente, insuficiente ou ineficiente; 2.3) criar uma regra jurídica paralegislativaque, conquanto não raro já haja sido rejeitada em processo legislativo regular, concretize esse princípio. Note-se que o juiz efetivamente legisla: não desempenha uma atividade técnico-burocrática de aplicação, mas uma atividade político-deliberativa de invenção. Em (2.1), o juiz extingue o ponto de partida; em (2.2), modifica o ponto de partida; em (2.3), cria o ponto de partida. Noutras palavras: em (2.1), o «texto normativo» é a disposição legal a respeito de uma determinada regra e a «norma jurídica» é o vazio deixado discricionariamente pelo juiz após ter «aplicado» um princípio de direito; em (2.2), o «texto normativo» é a disposição legal a respeito de uma determinada regra jurídica e a «norma jurídica» é o produto final da reformulação discricionária dessa regra pelo juiz mediante a «aplicação» de um princípio de direito; em (2.3), o «texto normativo» é a disposição legal a respeito de um determinado princípio de direito e a «norma jurídica» é a regra paralegislativa inventada pelo juiz mediante a concretização discricionária desse princípio.

Desse jeito, o Poder Judiciário funciona como uma «terceira casa legislativa», esdrúxula, sem legitimidade democrática, que revisa politicamente a lei que se comprometera a aplicar tecnicamente. Daí por que, quando o juiz «aplica per saltum» um princípio de direito, essa «aplicação» não está implicada em qualquer processo estritamente interpretativo: é deveras um processo preponderantemente criativo, sem nenhuma restrição. Logo, o que se objetiva com a «abissalização» entre «texto» e «norma» é a institucionalização de um voo cego: a certeza do ponto de partida e a incerteza do ponto de chegada. Entretanto, retirando-se dos princípios de direito qualquer caráter normativo, enfraquece-se a distinção entre uma coisa e outra. Obviamente, enfraquecer não é sinônimo de erradicar. A distinção persiste, pois são inerentes ao fenômeno linguístico as discrepâncias acidentais entre o ponto de partida e o ponto de chegada no processo interpretativo. No entanto, a separação entre «texto normativo» e «norma jurídica» deixa de estar no coração da teoria do direito; em consequência, deixa de ser um invariante da praxe jurídica. A bem da verdade, essa separação é primordial exclusivamente para «metodologias» [rectius: políticas instrumentais] que forjam um distanciamento abismal entre o «comando omnilateral da lei» e a «vontade unilateral do juiz». Enfim, é primordial somente para as propostas voluntaristas e, portanto, judiciocráticas.

Ademais, a separação tem trazido enormes confusões. Frequentemente se pensa que entre o «texto» e a «norma» há uma «diferença de natureza». Contudo, como já disse alhures, «produção pode significar, v. g.: a) criação [= embora não parta de qualquer matéria, o produto não entra na mesma categoria do produtor - ex.: criação dos anjos, do mundo e dos homens por Deus]; b) geração [= sem se partir de qualquer matéria, produtor e produto se tornam da mesma categoria - ex.: geração do homem pelo homem, das aves pelas aves, das plantas pela plantas]; c) renovação [= matéria e produto são da mesma categoria e são a mesma coisa, embora no produto se recuperem qualidades que a matéria perdeu - ex.: rejuvenescimento facial, retífica de motor]; d) beneficiamento [= matéria e produto são da mesma categoria e são a mesma coisa, embora o produto tenha novas qualidades - ex.: ganho de massa muscular, melhoramento genético]; e) interpretação [= matéria e produto são da mesma categoria, mas não são a mesma coisa - ex.: representação teatral, execução musical]; f) transformação [= matéria e produto não são da mesma categoria - ex.: fotossíntese, termólise, eletrólise]; g) montagem isocategorial [= as matérias reunidas e o produto são da mesma categoria - ex.: fotomontagem, montagem de quebra-cabeça]; h) montagem heterocategorial [= as matérias reunidas e o produto não são da mesma categoria - ex.: montagem de automóvel, instalação de antena externa]. […] Percebe-seque esses modos produtivos se dividem em 1) isocategoriais [= não há mudança de categoria - ex.: geração, renovação, beneficiamento, interpretação, montagem isocategorial] e 2) heterocategoriais [= há mudança de categoria - ex.: criação, transformação, montagem heterocategorial]. Percebe-se igualmente que os modos produtivos dependentes de matéria se dividem em 1) iso-objetivos [= matéria e objeto são a mesma coisa - ex.: renovação, beneficiamento] e 2) hetero-objetivos [= matéria e objeto não são a mesma coisa - ex.: interpretação, transformação, montagem]» (Garantismo é textualismo?. <https://cutt.ly/79n4iap>).

Como se vê, a interpretação é um modo de produção isocategorial hetero-objetivo: a obra interpretada [matéria] e a obra interpretante [produto] não são a mesma coisa, mas têm entre si a mesma natureza. Aliás, esse modo de produção é próprio ao universo da linguagem. Tomem-se os exemplos do ator e do instrumentista. Ambos interpretam textos: o autor, um script teatral para representar um personagem; o instrumentista, uma partitura para executar uma música. O script teatral e a representação do personagem não são a mesma coisa, talcomo não são a mesma coisa a partitura e a execução musical. No entanto, todas elas têm entre si a mesma natureza: são textos. A obra interpretante tem tanta textualidade quanto a obra interpretada. O script teatral é um texto verbal escrito; a partitura, um texto gráfico; a representação do personagem, um misto de texto verbal oral (falas) e texto não verbal (gestos); a execução musical, um texto sonoro. Destarte, a interpretação de um texto sempre produz um texto de interpretação. A interpretação nada mais é do que uma espécie de retextualização, de produção de um novo texto a partir de um ou mais textos-base, de transformação de uma modalidade textual em outra.

Daí se constata que «texto» e «norma» são péssimos termos para se demarcar a distinção entre o ponto de partida e o ponto de chegada no processo jurídico-interpretativo. O juiz parte de uma disposição «bruta» (o chamado «texto normativo») e, após a interpretação, chega a uma disposição «líquida» (a chamada «norma jurídica»), que é aplicável ao caso examinando. Indubitavelmente, a disposição «bruta» e a disposição «líquida» não são a mesma coisa. Sem embargo, ambas têm entre si a mesma natureza: são textos. Dessa maneira, a interpretação de um texto normativo sempre produz um texto normativo de interpretação. Mesmo antes do processo de interpretação, o «texto» [rectius: a disposição «bruta»] já tem normatividade: tem sempre algo a dizer por si só, sem que o intérprete tenha de dizer algo por ele; por isso, o «texto»é capaz de ordenar por si próprio a conduta humana desde a sua publicação, despertando obediência espontânea aos seus comandos e permitindo, assim, que os cidadãos desde já planejem as suas vidas em função dessa obediência. Não é preciso aguardar que o «texto» seja interpretado e aplicado pelo Estado-juiz para se saber o que o direito prescreve. Por sua vez, mesmo após o processo de interpretação, a «norma» [rectius: a disposição «líquida»] mantém a textualidade: i) trata-se de um conjunto ordenado de signos linguísticos interdependentes, que transmitem, como uma unidade de sentido em contexto, um imperativo hipotético-condicional [= textus = unidade = «aquilo que reúne, junta ou organiza elementos diversos e mesmo dissociados»]; ii) em consequência, trata-se de uma fresta para novos processos de interpretação [= textum = abertura = «infinita contextura de debates»] (para uma distinção entre textos e textum, v. ADAM, Jean-Michel. Dicionário de análise do discurso. Org. Patrick Charadeau et al. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2006, p. 466).

À vista disso, engana-se quem enxerga na norma a oclusão da interpretação, o encerramento para novas aberturas. O «texto» já tem normatividade. A «norma» não deixa de ter textualidade. O «texto» tem tanta normatividade quanto a «norma», que o sucede. A «norma» tem tanto textualidade quanto o «texto», que a antecede. Ao fim e ao cabo, a «norma» é isto: um «texto» retextualizado após o processo de interpretação, um novo texto produzido compreensivamente a partir de um texto básico. Lembre-se que o processo interpretativo de depuração sistematizadora permite saltar-se do conjunto assistemático das disposições «brutas» [«textos normativos»] para o conjunto sistemático das disposições «líquidas» [«normas jurídicas»]; por conseguinte, o ordenamento jurídico nada mais é do que um sistema de «normas» e, assim, de «textos» compreensivamente retextualizados. O amontoado das disposições «brutas» é a matéria prima, o ponto de partida, a textualidade normativa grosseira; o ordenamento jurídico é o produto acabado, o ponto de chegada, a textualidade normativa refinada. Em síntese, para se alcançar o ordenamento jurídico e, portanto, uma organização normativa dotada de unidade, coerência e completude, é preciso acomodar entre si todas as disposições «brutas»; para tanto, deve-se submetê-las em conjunto a um processo dinâmico e interminável de invalidações e interpretações (restritivas, ampliativas e declarativas).

Nada obstante, a discrepância entre as disposições «brutas» (os «textos normativos») e as disposições «líquidas» (as «normas jurídicas») nunca é considerávelem um Estado democrático parlamentar. Ela se torna preocupante apenas quando se torna uma prática sistemática de subversão política, em que se tenta implantar por vias transversas um «Estado aristocrático de jurisdição» e, assim, justificar cinicamente as três operações mentais estapafúrdias que o caracterizam: α) a «interpretação ab-rogante» [= suplantação da lei que, apesar de constitucional, afronte um princípio de direito]; β) a «interpretação corretiva» [= modificação da lei que, apesar de constitucional, não promova a melhor concretização possível de um princípio de direito]; γ) a «interpretação criativa ou propositiva» [= invenção de uma «lei» faltante que seja necessária para a concretização de um princípio de direito, posto que não se cogite de qualquer omissão inconstitucional]. Nada disso, porém, é interpretação autêntica e genuína. «Aplicar» princípio não significa interpretar, mas criar. É atividade legislativa, não jurisdicional. Como já disse alhures, «a própria obra-interpretada pode franquear ao intérprete determinadas ‘margens de liberdade’ e, consequentemente, obras-de-interpretação diferentes entre si. Todavia, se o ator imprimir adições, alterações ou supressões às falas de uma peça teatral de Shakespeare, já não estará mais interpretando Shakespeare, senão criando uma outra peça. Se o pianista imprimir adições, alterações ou supressões às notas de uma partitura de Bach, já não estará mais interpretando Bach, senão criando uma outra partitura. Se o juiz imprimir adições, alterações ou supressões às palavras de um dispositivo do Código Civil, já não estará mais interpretando o Código Civil, senão criando um outro dispositivo. Ressalte-se que na interpretação não há propriamente atividade criativa. O ator, o instrumentista e o juiz [= produtores] não «criam», respectivamente, a representação, a execução e a aplicação decisória [= produtos]. Em verdade, produzem-nas, fazem-nas,realizam-nas, constituem-nas de modo interpretativo, não criativo. Não as produzem ‘do nada’, mas desde uma base textual [= matéria]. Quem toma a criação pela produção, toma a espécie pelo gênero, baralhando os conceitos. No fundo, quer-se subverter os papéis, livrando o ator das amarras da peça que ele deve interpretar-representar, o instrumentista das amarras da partitura que ele deve interpretar-executar, o juiz das amarras do dispositivo que ele deve interpretar-aplicar decisoriamente. Ou seja, quer-se transformar o ator em autor, o instrumentista em compositor, o juiz em legislador. Quer-se, enfim, instituir o ativismo do ator, o ativismo do instrumentista, o ativismo do juiz» (Garantismo é textualismo?.<https://cutt.ly/79n4iap>).

Logo, em «condições normais de temperatura e pressão», o juiz está preso ao texto de direito positivo aprovado democraticamente pelos representantes eletivos do povo. Daí a desimportância justeorética da separação entre «texto» e «norma». Uma pseudoteoria dos princípios que se escore nessa separação configura uma política de perturbação institucional, que institui a supremacia da «norma» sobre o «texto», do juiz sobre o legislador, dos tribunais sobre os parlamentos, do Poder Judiciário sobre o Poder Legislativo, da aristocracia sobre a democracia.

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